Defensorias Públicas entram com recurso para assegurar alimentação aos alunos de Feira de Santana - foto Agência Brasil

Foto: Agência Brasil

Mais de três meses após a suspensão das aulas devido à pandemia do coronavírus, cerca de 52 mil alunos da rede municipal de ensino de Feira de Santana ainda não receberam os alimentos que compõem a merenda escolar. Com a justificativa de verba insuficiente para distribuir estes alimentos de maneira segura sem causar aglomerações, a Prefeitura de Feira de Santana entrou com uma ação na Justiça Federal para desvincular 8% das verbas de um Fundo de manutenção e desenvolvimento do ensino e destiná-lo, excepcionalmente, à distribuição da alimentação durante este período da pandemia, mas teve liminar indeferida.

Em um esforço conjunto para resolver o caso e em uma atuação considerada inédita, a Defensoria Pública do Estado da Bahia – DPE/BA e a Defensoria Pública da União – DPU resolveram intervir como parte ou custos vulnerabilis, ou seja, como guardiões dos interesses dos vulneráveis, e entraram com um recurso contra a decisão judicial e para assegurar o direito à alimentação destes alunos.

Na ação de nº 1005260-57.2020.4.01.3304, que tramita na 1ª Vara da Justiça Federal de Feira de Santana, a Prefeitura solicita a desvinculação de 8% das verbas precatórias do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização Magistério – FUNDEF e justifica a destinação para a alimentação escolar.

Pela lei, estas verbas devem ser aplicadas pelos municípios na educação, mas, na ação, a Prefeitura pede que, devido à pandemia, este valor seja destinado à distribuição da alimentação aos alunos durante este período em que as aulas estão suspensas. O órgão alega não ter como continuar a arcar com a entrega dos alimentos, pois o valor recebido do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE, que é a fonte dos recursos para a merenda escolar, por aluno é insuficiente [este valor varia entre R$ 6,40 e R$ 21,40] para a confecção de kits, assim como a entrega dos kits geraria aglomeração das pessoas. A ideia é complementar este valor, efetuar depósitos em cartões de débitos e fornecê-los aos pais e responsáveis.

“As crianças da rede pública municipal de Feira de Santana, distribuídas em aproximadamente 206 escolas da zona urbana e rural, estão sem aula desde o início da pandemia, o que lhes retira o direito à merenda escolar, única alimentação completa de muitas delas durante o dia inteiro. Sensível a isto, as Defensorias do Estado e da União, em atuação inédita no país, recorreram contra a decisão que negou a liminar ao Município e não autorizou que fossem gastos os cerca de 20 milhões de reais em merenda escolar, que, neste momento está parado na conta, e que só pode ser gasto com algumas despesas específicas para a manutenção da educação”, explicou o defensor público estadual, Maurício Moitinho, que assinou a petição junto com o defensor público federal Erik Boson. Os dois atuam na cidade de Feira de Santana.

No agravo interposto, as Defensorias ressaltam que a alimentação escolar pode ser considerada como “manutenção e desenvolvimento do ensino”, que é o que determina o FUNDEF, apesar dela ter a sua fonte de custeio próprio – o PNAE.

“Ao recorrermos da decisão alegamos que a alimentação escolar tem a natureza de ser uma despesa de manutenção e desenvolvimento do ensino, pois o poder público é obrigado pela Constituição a desempenhar o ensino de modo a garantir a permanência e a continuidade do aluno na escola, e isto é impossível de ser obtido sem a merenda escolar. O que a Constituição prevê apenas é que as despesas de alimentação e transporte serão custeadas por verbas oriundas de outras fontes de custeio, que não o FUNDEF”, acrescentou o defensor Maurício Moitinho.

Ao ajuizar a ação, no mês de abril deste ano, a Prefeitura de Feira de Santana pediu autorização para gastar os 8% das receitas oriundas do precatório do FUNDEF com ações de combate ao coronavírus, o que poderia incluir o fornecimento alimentação escolar através de cartão de débito. “Por isso, a DPE e a DPU pedem no recurso que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região reforme a decisão, e conceda a liminar pedida pelo Município, porém apenas para autorizar que os 20 milhões de reais sejam gastos exclusivamente com merenda escolar, e não com os gastos relacionados ao combate à Covid-19, já que saúde não integra despesa de manutenção do ensino”, acrescentou Maurício Moitinho.

Ainda de acordo com o defensor, esta intervenção na ação entra para a história da DPE/BA, que já vem atuando em diversas ações coletivas para garantir os direitos dos mais vulneráveis durante esta pandemia causada pelo novo coronavírus. “Esta demanda, relacionada à desvinculação de um precatório, é um marco na Defensoria Estadual, ao atuar de forma coletiva em favor dos assistidos, mas buscando que o custeio da política pública se dê com recursos oriundos da União. Podemos, seja atuando como parte ou como custos vulnerabilis, intervir para que verbas sejam liberadas, ou para que a União custeie determinado serviço de competência comum aos Estados e Municípios”, garantiu. (DPE/BA)